quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Rita Guerra, Cantora

Entrevista de Adélio Amaro
Fotografias de Sandra Amaro

A Rita Guerra passou parte da sua infância nos Açores, na Ilha Terceira. Que recorda dessa fase da sua vida?
Tanta coisa. Eu vivi no Bairro de Oficiais da Base das Lajes, nos anos 80. Lembro-me praticamente de tudo. Foi uma fase muito marcante da minha vida. Foi uma fase da vida que eu acho extremamente importante que é a nossa adolescência. E, as experiências que lá tive foram todas positivas.

Tem saudade?
Tenho muita saudade. Ainda recentemente fiz escala lá, a caminho da ilha Graciosa. E do Aeroporto Civil tive oportunidade de voltar a ver a zona do Bairro onde habitava… Lembro-me praticamente de tudo como era, porque hoje está diferente. E tenho a sorte de ter feito concertos na Ilha.

Conhece outras Ilhas?
Sim. Da ilha de São Miguel, recordo-me de algumas coisas, porque tenho lá família e estive lá o ano passado a fazer um concerto nas Portas da Cidade. Estive no Rali Sata Açores, onde fui cantar o Hino dos Açores. Este ano estivemos no Pico, em São Roque… isto para dizer que não conheço todos mas que conheço um pouco de todas as que já visitei, faltando-me apenas visitar o Corvo e Flores. Tive a oportunidade de conhecer, recentemente a Graciosa.

Esteve na Graciosa onde foi madrinha da Gruta do Enxofre candidata às Sete Maravilhas Naturais de Portugal. Como é que surgiu o convite?
O convite surge, precisamente, por saberem que eu tinha uma afinidade muito grande com o Arquipélago e o facto de ter lá vivido. Eu menciono várias vezes, em entrevistas, a minha passagem pelos Açores e sempre com grande saudade. De maneira que alguém terá sabido e entendeu convidar-me.

Que achou da Gruta do Enxofre, na Ilha Graciosa?
Tive pena de não conseguir ver a Gruta do Enxofre, porque naquele dia o nível de dióxido de carbono estava muito alto e era proibido entrar. Mas, tive a oportunidade de ver a visita virtual que eles têm lá disponível. Tive, ainda, a oportunidade de ver a boca da gruta e ver o espaço maravilhoso onde está localizada.

Depois dos Açores como é que surge a música na vida da Rita Guerra?
A música sempre esteve cá a fervilhar. Mas, foi nos Açores, precisamente, que eu percebi que também conseguia acompanhar-me ao piano. Eu tocava piano e cantava e nos Açores descobri que conseguia fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Tentei fazer as duas coisas juntas e gostei do resultado e da experiência.
Entretanto as oportunidades foram surgindo e eu acabei por conseguir, felizmente, ter a sorte de enveredar pela música. Tive a sorte de conhecer as pessoas certas.

O maestro Pedro Osório é uma pessoa fundamental na sua carreira?
Claro que sim. O Pedro Osório é um génio, é um excelente músico, é um grande amigo. Foi director musical no Casino do Estoril durante muitos anos e é um músico por excelência.

As participações nos Festivais da Eurovisão são marcos que ficam na sua carreira. Teve a oportunidade de participar mais de que uma vez. Acha que Portugal alguma vez vai conseguir ganhar esse Festival? Depois de ter apresentado tão boas vozes, como foi o caso da Rita Guerra?
Eu já ouvi dizer tanta coisa sobre a Eurovisão… as coisas que eu ouvi foram todas muito feias… eu não vou reproduzir porque não o devo fazer… e por isso mesmo, as coisas feias que ouvi, não sobre Portugal, mas sobre a forma como eventualmente é gerido tudo o que rodeia a noite da Eurovisão, por aquilo que eu sei, Portugal nunca vai ganhar.

“As Canções do Século” foi um projecto que ajudou a sua carreira a dar um salto mais visível perante o público?
Sim, sem dúvida. “As Canções do Século” foi um projecto que teve imensa audiência, naquele Festival da Canção, no ano em que ganhou a Anabela. E, a partir daí, começaram a surgir muitos convites e fizemos quase sete anos de espectáculos ao vivo. E, era um espectáculo muito caro, e nem por isso deixaram de contactar e contratar.
Foi extremamente importante. Teve imensa projecção. Houve muita gente a procurar o disco, que não estava gravado. E, depois tivemos oportunidade de fazer um espectáculo ao vivo no Casino do Estoril para ser filmado e gravado e ver, finalmente, o registo que pudesse ser vendido ao público. Este projecto foi encomendado apenas para a noite do Festival e de repente foi um sucesso enorme e acabou por ser um bom trampolim para todos nós.

Durante 21 anos esteve a fazer espectáculos no Casino do Estoril. Foi por opção própria ou entendeu que ali poderia elevar a sua carreira?
O Casino é uma casa maravilhosa, com grandes espectáculos de qualidade, mas tem um público itinerante. Tem um público muito variado e diferente. As pessoas que ali vão, na sua maioria, não vão para ouvir a Rita Guerra. As pessoas vão ali para ver o espectáculo, para ali jantar… e existem muitos grupos estrangeiros que por ali passam.
Obviamente que tem de ser um espectáculo para agradar a todos e não é um espectáculo onde se destaca apenas um cantor ou uma cantora, ou um bailarino ou um solista…
Sendo assim o público nunca era mesmo e o espectáculo sim, era sempre o mesmo durante um ano e meio ou dois anos, porque tinha uma produção muito cara.
Sendo assim, é óbvio, que não é muito criativo para um artista cantar as mesmas coisas todos os dias.

Esta nova fase de espectáculos no exterior acha que é melhor do que estar diariamente no mesmo palco?
É muito melhor do que estar sempre no mesmo palco. Eu acho que não se pode comparar uma situação com a outra, porque são completamente distintas e apenas têm em comum a música.
Agora, chegar ao final deste tempo todo e vir para junto do público e estar ao alcance de toda a gente é muito bom.
Enfrentar o público pelo país fora, e não só, para mim, faz sentido. É maravilhoso ver que realmente tenho um apoio gigante de pessoas que gostam de mim, que gostam das minhas músicas, que gostam do nosso espectáculo e que vão assistir, mesmo que esteja frio ou a chover.
Já dei espectáculos perante vinte mil pessoas, a chover muito, e foi maravilhoso ver as pessoas a assistirem sem arredar pé, mesmo com as más condições do tempo.

Foi a Rita Guerra que entendeu deixar o Casino?
A determinada altura entendi vir embora. Cheguei ao pé do Pedro Osório e disse-lhe que estava na altura de deixar o Casino e ir para os espectáculos no exterior. Ele disse-me: “Como produtor musical do Casino peço-te por tudo que não vás embora. Como amigo, vai-te embora já.”. Portanto, houve uma altura em que realmente senti que deveria ir embora… mas, foi-me pedido para não sair, até porque era uma época muito complicada, porque o Casino ia entrar em obras e o espectáculo ia passar para uma sala muito pequena e precisavam de um nome que tivesse consistência para chamar público. Eu disse que sim, acabei por ficar. Era confortável, onde se tinha trabalho 365 dias por ano.

Quando sai é o momento certo para a continuação da sua carreira?
As coisas aconteceram no tempo certo em que tinham de acontecer. Não acho que saí de lá tarde demais, porque tinha cá fora um público enorme a esperar por mim. Senti que as pessoas não se esqueceram de mim e sinto uma energia e uma vontade enorme de continuar.

O nível de vendas de um CD é fruto de alguém que gosta de um determinado trabalho. Após a sua saída do Casino as vendas dos trabalhos da Rita subiram?
Sem dúvida. Foi uma coisa astronómica. Sabe, estou com 42 anos mas sinto-me uma miúda, com tudo isto.

Recentemente sagrou-se vencedora no “Top Choise Awards”, na categoria de “Top Internacional Female Singer 2009” através da votação da comunidade portuguesa residente no estrangeiro. Como é que surge esse reconhecimento do público português no estrangeiro perante o trabalho da Rita Guerra, mesmo com poucas actuações realizadas fora do país?
Eu penso que é através do conhecimento que a comunidade portuguesa tem do meu trabalho, essencialmente através da televisão, rádio e Internet. Por isso, estou completamente disponível e com muita vontade para cantar ao vivo para os nossos emigrantes, porque eles são, sem dúvida, o exemplo da nossa representação portuguesa no estrangeiro. A eles agradeço muito este prémio que me foi atribuído dois anos seguidos.

Está agora a promover o CD “Luar”. De todos os trabalhos que editou qual foi o que lhe deu o verdadeiro impulso para a promoção da sua carreira perante o público?
Eu estou a promover o “Luar” que é um trabalho mais acústico e por ter outros compositores. Mas, o mais importante, que foi o que marcou a viragem para a fase em que eu estou agora, foi o “Rita”. Foi importante a vários níveis e foi uma pedra muito rija que ficou ali no meu caminho. Foi um marco muito grande e um ponto de viragem na minha carreira. Os outros trabalhos foram sempre diferentes uns dos outros, acreditei sempre naquilo que fiz, embora, pensando hoje, teria feito algumas coisas diferentes, mas isso faz parte do percurso… se eu soubesse o que sei hoje…
Eu vou continuar a fazer aquilo em que acredito e enquanto os trabalhos futuros não estiverem como eu quero, não sai nenhum. Portanto, eu continuarei, sempre, a pautar do crédito daquilo que faço, com qualidade e trabalho.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Artur Agostinho, Comunicador

Entrevista de Adélio Amaro

A sua apetência pela Rádio surgiu ainda no seu tempo de estudante?
A apetência pela Rádio começou ainda em garoto – tinha os meus 12/13 anos, portanto logo nos meus primeiros tempos de Liceu. Nas horas de lazer, depois de terminados os deveres escolares, entregava-me ao prazer fascinante de ficar a ouvir rádio, durante horas e horas. Também a colectividade do meu Bairro – o Campolide Atlético Clube – teve, nos finais dos anos 30, grande influência na minha decisão de enveredar pela vida artística.
Foi, sem dúvida, o Rádio Clube Português – o velho e saudoso CT1GL – que mais contribuiu para essa profunda paixão que iria acompanhar-me pela vida fora.

Para um jovem, no início da sua carreira, como era conviver com grandes nomes da Rádio, em plena década de trinta, como Fernando Pessa, Olavo de Eça Leal e Maria de Rezende?
Foi a realização de um sonho que parecia impossível ou… quase. Foi dos acontecimentos mais gratificantes da minha vida que me fez sentir que vale sempre a pena sonhar e acreditar que a concretização dos nossos desejos também depende, em grande parte, de nós próprios, da nossa persistência, da nossa força de vontade, do nosso trabalho e de um pouco de… paciência. Além do mais, é muito importante e decisivo que saibamos aproveitar, no momento certo, a oportunidade que o Destino coloca ao nosso alcance, por vezes quando menos o esperamos. Quando comecei a conviver profissionalmente com esses “monstros sagrados” da Rádio e, muito especialmente, com o João da Câmara (ele não gostava que eu o tratasse por “Dom”), foi muito importante ter a humildade de ouvir os seus conselhos, absorver os seus ensinamentos e reconhecer alguns “vícios” adquiridos e acumulados na fase de simples amador, por falta de quem, com autoridade para o fazer, me corrigisse.

Mais tarde teve a grande oportunidade de entrar para a Emissora Nacional. Como é que se deu esse passo importante na sua vida?
Foi no antigo Café Palladium, onde se reunia uma tertúlia de gente da rádio e do cinema, que fui abordado pelo Francisco Matta, jornalista de “O Século” e produtor da Emissora Nacional. Convidou-me a participar num concurso para locutor que a EN iria abrir no sentido de colmatar a sangria que se verificara no seu quadro de locutores, com a saída de Maria de Rezende, Áurea Rodrigues, Olavo de Eça Leal, Jorge Alves (contratado por uma emissora norte-americana para apresentar o programa “Voz da América”) e ainda a perspectiva da demissão, já anunciada, de Fernando Curado Ribeiro.

Durante essa fase da sua vida tinha noção que a sua voz começava a ser uma marca para quem escutava rádio, já em plena década de quarenta?
Apenas nos finais dessa década e começo dos anos 50, comecei a ter alguma noção de que um número razoável de ouvintes me distinguia com a sua preferência. Além do programa “Que quer ouvir”, os “Serões para trabalhadores” e, principalmente, o “Programa da manhã” deram-me alguma popularidade para o que contribuiria, mais tarde, para a minha participação assídua na área desportiva – principalmente nos relatos de futebol, no hóquei em patins e na “Volta a Portugal” em bicicleta.
Sinceramente, nunca confundi “popularidade” com aquilo a que poderá chamar-se a “marca” de uma voz.

Recorda o seu primeiro trabalho no exterior?
A minha primeira reportagem, ao serviço da Emissora Nacional, foi a de um lançamento à água de um barco destinado à nossa Marinha mercante. Curiosamente, a cerimónia que contou com a presença do então Presidente da República, general Óscar Fragoso Carmona, foi marcada por uma peripécia que teve aspectos verdadeiramente insólitos. No momento em que o Presidente lançou a tradicional garrafa de “champanhe” contra o casco do navio e este começou a deslizar pela rampa de lançamento, o seu movimento não foi além de aproximadamente um metro. O incidente provocou algum mal-estar porque as diligências a que procederam, de imediato, os responsáveis do estaleiro não resultaram.

Durante as décadas de quarenta e cinquenta acompanhou grandes vedetas do Desporto. Quais foram os nomes do mundo do Desporto que mais recorda dessa época?
Foram tantos que, se tivesse a veleidade de os citar a todos, correria o risco de cometer a injustiça de esquecer alguns deles. Em todo o caso, desde as grandes figuras dos tempos mais recuados, como Azevedo, Carlos Gomes, Chico Ferreira, Félix, Manuel Passos, as famosas “torres de Belém”, o Barrigana, ou os inesquecíveis “cinco violinos” do Sporting (Jesus Correia, Vasques, Peyroteo, Travassos e Albano).
Depois, os “europeus” do Benfica (entre os quais Costa Pereira, Germano, Coluna, José Augusto, Águas, Torres, Simões e Eusébio), o Morais, do Sporting, que me deu aquela extraordinária alegria da conquista da “Taça das Taças”, ou os “heróis” do Mundial de 66, são nomes guardados para sempre na minha memória, como a “velha guarda” do hóquei em patins (Emídio Pinto, Raio, Edgar, Jesus Correia e Correia dos Santos) ou grandes atletas como Manuel Faria, Manuel Oliveira, Carlos Lopes, Mamede ou ciclistas como Alves Barbosa, Ribeiro da Silva, Sousa Santos, Sousa Cardoso, Jorge Corvo, João Roque e o incomparável Joaquim Agostinho.
Que me perdoem todos aqueles que não incluí nesta citação mas o espaço não dá para todos – embora sejam muitos os que mereciam uma referência especial.

Depois da rádio nasce o “amor” da televisão. Recorda a sua primeira presença na RTP assim como o primeiro programa em que participou ou apresentou?
Lembro-me de ter participado numa das primeiras emissões experimentais da RTP, realizadas no antigo recinto da Feira Popular, nos terrenos hoje ocupados pela Fundação Gulbenkian. Curiosamente, foi o Baptista Rosa que me foi esperar ao Aeroporto de Lisboa, no meu regresso de uma viagem ao serviço da Emissora Nacional não me permitindo sequer que fosse deixar as malas em casa. “Arrastou-me” directamente para a Feira Popular, tendo a minha bagagem ficado no carro da RTP que me transportou, afim de participar num programa de Variedades que estava a ser apresentado pelo locutor Domingos Lança Moreira. Ali, contei duas ou três anedotas para uma plateia de mais de um milhar de espectadores, nessa altura, completamente “apanhados” por essa novidade chamada televisão. Só depois, me levaram a casa para desfazer as malas, tomar um banho e descansar.
Passei, depois, a colaborar regularmente na RTP onde me estreei no seu primeiro concurso, chamado “Veja se adivinha” e que foi o percursor do que viria a ser o famosíssimo “Quem sabe, sabe”.

Depois de vários “amores” como a Rádio, a Televisão, surge uma nova paixão – o Jornalismo. Gostou da experiência enquanto director do jornal desportivo “Record”?
Foi uma experiência muito enriquecedora na vida de jornalista, até porque me entreguei, de alma e coração, à tarefa que me confiaram. Creio, sem falsa modéstia, que fui um director 100% participativo na feitura do jornal. Desde a concepção, à escrita, à paginação na tipografia do “Diário Popular” e à própria impressão, fazia questão de acompanhar todas as etapas da feitura do “Record”.

Teve a oportunidade de trabalhar e conviver com grandes artistas. Mas, existe uma artista, que agora se comemora o 10.º aniversário do seu falecimento, que levou o nome de Portugal por todo o Mundo – Amália Rodrigues. Que recordações tem dela?
Já, em diversas ocasiões, tenho expressado a minha grande admiração pela inesquecível Amália e a amizade que mantivemos ao longo de muitos anos.
Amália foi um caso único na nossa, infelizmente, tão limitada constelação de artistas cujo nome e talento ultrapassaram as fronteiras deste País, tão pequeno em território mas de alma tão grande e generosa. Ela foi, sem dúvida, uma autêntica “bandeira” de Portugal, perpetuada pela sua voz inconfundível que viverá para sempre na memória da nossa gente.
Pessoalmente, era uma mulher simples, generosa e humilde com quem se podia contar, tanto nas horas boas como nos momentos difíceis.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Jorge Gabriel, Apresentador

Entrevista de Cid Ramos
Fotografia de Jorge Henriques

Qual o segredo para o seu sucesso?
Não há segredos. Está muito longe de se tratar de uma ciência oculta. Como já alguém disse, a fórmula é simples: 90% de trabalho e 10% de talento. A sorte é inquantificável, porém tem que constar nesta equação. Só não sei em quanta medida.

O formato da praça da Alegria está esgotado?
Estes programas renovam-se diariamente. A rotina é a nossa principal inimiga. Podemo-nos inebriar com resultados positivos numa semana, para logo nos cinco dias seguintes descermos à terra e percebermos que afinal o programa necessita de adrenalina e novidade constantes. O “Praça” é uma instituição do serviço público. Distingue-se a léguas dos programas da concorrência.

Continua a considerar “O Bar da TV” a sua pior experiência em Televisão?
Sem sombra de dúvida. Fi-lo em condições muito adversas para a SIC. Eu foi o único apresentador que aceitou o desafio proposto pelo Emídio Rangel, sabendo ele o quanto me repugnam estes formatos. À vida privada o que é da vida privada. Expô-la daquela forma é muito perverso e imprevisível. O que ocorreu com alguns dos participantes nestes programas fala por si. A vida do comum dos mortais, onde me incluo, deve ter regras invioláveis. Quem brinca com o fogo acaba por se queimar.

Já foi treinador de futebol, que recordação guarda?
Tive momentos de prazer inolvidáveis que não compensam todos os outros que diariamente lemos nas publicações desportivas e judiciais, dos quais me envergonho profundamente. O futebol português tem que conhecer uma vaga de fundo que o renove. Aliás, não é alheio o futebol a toda a sociedade que não olha aos meios para a obtenção dos fins.

Sente-se triste com o seu Sporting?
Sinto-me triste pela incompetência. Há no Sporting gente capaz que está excluída porque não pertence ao mundo financeiro, aos circuitos de golfe, a por não dispor de apelidos brasonados. Uma lástima.

Confiante numa boa prestação de Portugal no Mundial?
Sou um optimista por natureza. Se os egos forem amestrados, em favor do colectivo acredito piamente num desempenho igual ou melhor que nas últimas participações nas grandes competições. Aliás, gostava de ressalvar a importância de José Mourinho para os sucessos recentes. Lembram-se de uma teimosia no jogo inaugural do Euro 2004 com uma equipa que ignorava o trabalho feito no F.C. Porto. Após tamanho disparate e baseando a estrutura no losango portista chegámos à final. A actual equipa é mais jovem, ambiciosa e é a terceira do ranking mundial.

Carlos Alberto Moniz, Maestro, Apresentador

Entrevista de Adélio Amaro
Desde o início da sua carreira que se dedica à música. Como é que esta surge na sua vida?
Quer quisesse quer não quisesse já o meu avô, João Moniz, era maestro e violonista. Fez uma recolha muito grande da música popular açoriana. Existem muitos manuscritos. Eu tenho alguns desses manuscritos, das nossas modas: “O Sol perguntou à Lua”; “São Macário” a “Lira”... tenho os manuscritos dele. Depois, o meu pai foi embalado aos ensaios da Orquestra do meu avô e adormecia, muita vez, no sofá enquanto a Orquestra tocava. A seguir, o meu pai, pianista de uma Orquestra de Jazz, tocava, também, em casa e eu lá ia adormecendo ao som do meu pai.
Mais tarde, comecei a aprender piano e violino com o mestre Raul Coelho, professor de piano e harmonia, da Terceira, e com o mestre Manuel Arraial, professor de violino, de São Miguel.
Alguem tempo depois, fui estudar para Lisboa, entrei para o Conservatório, além de Agronomia, fui aprendendo sempre com mestres como Pedro Osório e outros que me passaram parte do saber que tinham, porque o saber integral não se consegue passar.

Os grandes mestres, quando deixam a vida terrena, levam o saber completo com eles...
O que eu tenho mais pena da morte das pessoas... pode ser uma posição um bocadinho egoísta... é o saber que com elas desaparece porque não foi possível fazer save no disco externo. E, existe tanta sabedoria que se foi embora e não ficou registada que me faz muita impressão, além da falta que os amigos fazem e da saudade... tenho este pensamento um bocadinho materialista, confesso. Mas, se eu pudesse ter a arte de um Antero de Quental, de um Nemésio ou de um Mozart ou mesmo de um Beethoven, ou de outros mais recentes...

Conviveu e convive com grandes homens e mulheres do mundo da Música e da Literatura. Nos primeiros anos da sua carreira tinha noção de que estava a conviver com homens e mulheres de grande valor e até, de certa forma, mais evoluídos que os restantes?
Mais agora do que na altura. Passava muitos serões com Luís Tó Monteiro, Bernardo Santareno, Afonso Praça, José Carlos Ary dos Santos, Fernando Tordo, Paulo de Carvalho e muito mais gente. Aliás, uma vez perguntaram à Lúcia, a minha filha, porque é que ela não era vaidosa e ela respondeu: “porque é que eu hei-de ser vaidosa se eu comia sopa ao colo do Fernando Guerra, com o Paulo de Carvalho a dar-me o bife e o Fernando Tordo a descascar- -me a fruta! Quem sou eu, se fui educada ao colo desta gente toda”.
De facto era gente muito importante e a prova é que a obra ficou. A importância era tal que me marcou em termos de conduta como cidadão. Tenho, agora, consciência do que eram Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Carlos Paredes... fartei-me de correr mundo a tocar com eles e a gravar discos... é gente que me ensinou que viver não é só comer, beber e defender uma outra posição, mais ou menos, rigidamente. Temos que ter na prática, do dia-a-dia, a coerência com aquilo que afirmamos. Não basta ir cantar uma cantiga sobre a Liberdade e depois ser um déspota no dia-a-dia nem falar em solidariedade e depois esquecer a solidariedade. Hoje em dia se a gente perguntar a qualquer pessoa o que é que pensa dos deficientes, toda a gente diz: “temos que ajudá-los muito, temos que ter muito respeito”. Mas, se atravessarmos uma grande cidade são milhares, não são centenas, de automóveis em cima dos passeios. E, se, por exemplo, um deficiente quiser passar de cadeira de rodas, não passa. E, se perguntarmos a cada uma dessas pessoas, todas têm muita pena e todas são caridosas lá da sua forma especial.
Portanto, fui aprendendo, ao longo da minha vida, com estas grandes figuras, como Sophia Mello Breyner, Nemésio e outras que me vou lembrando aos poucos... a ter o cuidado da palavra mas também o que as palavras querem dizer... não basta juntar palavras bonitas, as palavras juntam-se e fazem frases, as frases definem ideias e quando se dizem determinadas frases essas ideias, que estão subjacentes, ou as praticamos ou então vamos para actores representar o papel de outros...

Ao longo da sua vida, esteve quase sempre ligado à Música, passou ligeiramente pelo Cinema, fez Televisão, mas existe um pormenor que lhe está sempre patente – nunca esqueceu os Açores...
Eu costumo dizer que vivo nos Açores, só que o meu trabalho é muito longe e passo muito tempo fora de casa. Tenho a minha casa na Praia da Vitória, ilha Terceira, só que por vezes, estou no Canadá, estou em Lisboa, estou no Porto, estou no Alentejo... África do Sul, Timor, Brasil... nunca paro no mesmo sítio e 90% dos contactos que tenho são açorianos que me chamam para ir aqui e ali.

E, no caso concreto da Lusofonia, através do programa que tem na RTP, "Portugal sem fronteiras", tem encontrado açorianos no meio Lusófono que está espalhado pelo Mundo?
Tenho. Se bem que eu acho que ser açoriano não é formar um clube de elite mas, sim, defender os nossos valores, as nossas gastronomias, a nossa música popular, as nossa touradas à corda, as nossas marchas, os nossos bailinhos de Carnaval, existe uma necessidade muito grande de divulgar isso o mais possível.
Hoje em dia, numa sociedade em que a comunicação é tão fácil, já não existe especialidades, obras, receitas, manifestações culturais que sejam só na região onde são feitas. São exemplo os bailinhos de Carnaval, que eram uma coisa que se fazia e se faz, felizmente, 60, 70, 80 bailinhos que saem em cada Carnaval, na ilha Terceira, inspirados nas cegadas do Continente. Tudo isto, alguns anos para cá, está na Net. Portanto, podemos estar em Timor, nos Estados Unidos ou no Médio Oriente a ver bailinhos de Carnaval. E, por isso, é que eu acho que ser Açoriano não é fechar as coisas no baú da nossa memória mas, sim, levá-la a todos.

Na sua carreira, onde é que se sentiu mais realizado, sabendo que além de compor, participou no Festival da Canção e na Eurovisão onde dirigiu a Orquestra, participou em vários programas de televisão como responsável pela composição musical, fez espectáculos?...
Eu tento nunca ser um artista ou cidadão como aqueles falsos arquitectos que costumo designar. Existem muitos artistas e criativos a quem se pergunta: "que é que estás a fazer?". Eles dizem: "tenho um projecto, ando há quinze anos a pensar nisso, mas ainda não está bom para apresentar". Eu, durante os últimos quinze anos, se calhar, os projectos não serão tão bons como esses pensadores mas, a verdade, como disse, é que já fiz televisão, fiz cinco anos de rádio em que entrevistei as finas flores, desde a ala esquerda à ala direita, desde o Garcia Pereira ao José Ribeiro e Castro, por exemplo, passando por todos os outros representantes da justiça e do poder. Na televisão estou a fazer um contacto que está a correr muito bem, que tem portugueses que nos ligam desde o Médio Oriente, Macau, Timor, além das Américas e toda a Europa.
O dirigir a Orquestra foi uma das sensações de poder maior que eu tive na vida, particularmente na Eurovisão, sabendo que estavam milhões de pessoas, tanto na Suécia como na Jugoslávia, embora também tenha estado na Noruega. Mas, nestes dois primeiros em que fui dirigir a Orquestra e que estava com os braços prontos para dar entrada, passou-me pela cabeça: e se eu agora não entrasse, como é que era? É uma sensação de poder.
Claro que entrei. Se não tivessem confiança em mim a RTP não me tinha mandado lá. São estes grandes desafios que eu gosto de correr.
Estreei, alguns meses, uma Cantata com um coro de oitenta e tal figuras e uma Orquestra de cinquenta e tal e com quatro solistas, soprano, contra-alto, baixo e tenor sobre os 25 anos de Património Mundial, que também está na Net: “Cantata Património Mundial Angra do Heroísmo”.

E o Teatro, a Revista e o Cinema?
Para Teatro nunca tive jeito. Fiz muita música para Revista. Cinema fiz alguma coisa porque o Jorge Paixão da Costa e o Moita Flores são "malucos" e acham que eu sou actor. Ou, então, querem rir de mim ou são mesmo meus amigos. Já me colocaram a representarem vários situações mas, penso que o fizeram por amizade. O que eu gosto, mesmo, é de improvisar, disso não tenho medo nenhum.

Acontece um pouco isso com o seu programa "Portugal sem fronteiras", na RTP, com a ajuda da Diamantina?
Sim, porque a Diamantina é uma grande companheira que eu tenho no programa, é do Peso da Régua, estamos sempre a brincar com a situação de eu ser Açoriano e ela do Porto, eu do Benfica ela do FCP, estamos sempre pegados mas, é um conflito de gerações apenas...

Ruth Marlene, Cantora

Entrevista de Cid Ramos
Fotografia de Hélder Ferreira
Como surgiu no mundo da música?
Eu acho que não comecei a falar, mas sim a cantar. Entrei aos seis anos, num coro da escola e depois entrei noutro, no Lavradio, na altura em que morava no Barreiro. Era a vocalista do coro, mas infelizmente o grupo terminou e eu senti necessidade de continuar a cantar. Gravei o meu primeiro álbum aos 10 anos e a partir daí, nunca mais parei.

“Uma lágrima que cai” marcou o início de uma carreira de sucesso?
Fico muito feliz de se lembrar da minha primeira música, que foi composta por mim. Já la vão dezasseis anos. Como o tempo passa. Felizmente tenho tido uma boa aceitação por parte do público e isso deixa-me como é normal, extremamente feliz.

O seu espectáculo está um pouco diferente, com ritmos mais variados. A que se deve esta mudança?
Acho que não podemos estar estagnados num estilo de música. Desde o meu primeiro disco eu sempre compus baladas, eu nunca fiz uma música alegre.
Tem a ver com o meu lado romântico, mas também sou extremamente alegre e gosto que o meu espectáculo seja bastante alegre, e que as pessoas se divirtam com as minhas músicas. Acho que o meu espectáculo tem evoluído.

A família é extremamente importante para si?
Sim. A minha mãe, irmã, irmão e pai são tudo para mim. A minha mãe acompanha-me sempre nos espectáculos e considero-a como a nossa guerreira. Ela é a nossa directora artística e faz-nos a roupa.

Sente-se uma mulher realizada?
Nunca me sinto realizada, eu quero sempre mais. Os meus sonhos são sempre a curto prazo para eu não me desiludir. Agora vou terminar tournée e depois, vou começar a pensar, no meu próximo álbum.

Com quem fazia uma dupla?
Com a Jessica Claro. Há uns anos fiz uma brincadeira com o Olavo Bilac, dos Santos e Pecadores, mas para uma dupla definitivamente a Jessica.

Faz muitos espectáculos no estrangeiro. Como é a aceitação do público?
São muito carinhosos e tratam--nos muito bem. A comunidade emigrante como está longe do seu país, torna sempre mais emotivo o espectáculo. Um beijinho para todos os emigrantes.

A Ruth Marlene afirmou há alguns anos que nunca iria pousar para a Playboy?
Sim. É verdade. É uma boa pergunta.

O que a levou a mudar de decisão?
Acho que mudei um pouco a minha opinião, em relação a essa situação. Foi algo que achei que devia fazer e pousar ao lado da minha irmã, deu-me muito mais confiança.

Considera-se uma "coisinha sexy"?
Todos os portugueses são uma coisinha sexy.

Um sonho?
Fazer um álbum de baladas, com músicas compostas por mim e escrever um livro com os meus pensamentos.

Mickael Carreira, Cantor

Entrevista de Adelino Sá

Mickael Carreira, filho de um nome consagrado na música ligeira, qual é a sensação de seguir as pisadas do pai?
O que é mais importante é fazermos aquilo que mais gostamos.
Eu acho que quando uma pessoa tenta ir atrás dos passos todos do pai ou da mãe, não creio que seja o caminho mais certo. Eu sempre tive um gosto enorme pela música, mas é claro que o facto de ter sempre a música em casa, ajudou-me ainda mais a despertar o gosto pela própria música.
Não escondo que tenho apenas um ano e meio de carreira, mas já tenho os meus fãs que me acompanham por todo o lado como aqui na Suíça. É uma felicidade enorme dado que transmitem um grande carinho para com a minha pessoa.

O Mickael considera-se essencialmente um cantor romântico?
Não nego que me considero um cantor romântico. Eu confesso que adoro cantar baladas mas também gosto muito de cantar músicas mais mexidas.

E quanto às musicas em si, têm ajuda do pai ou é o próprio Mickael que as compõem?
Não, as músicas são só minhas, aliás neste disco acho que há só duas participações do meu pai em dois temas.
Agora a maioria das músicas são da minha autoria. Eu faço sempre muito gosto que o meu pai colabore com um ou outro tema. Mas, a maioria dos temas são da minha autoria, com a produção do Ricardo Landum.

Quais são as suas perspectivas para o futuro?
Sinceramente, eu espero que tudo corra tão bem como tem corrido até agora. Já me deram tanto este ano e espero que continuem sendo meus fãs durante muito tempo. As perspectivas são de promover o meu trabalho em CD e esperar que as pessoas gostem como gostaram do primeiro.

O Mikael viveu grande parte da sua vida em França?
Sim, vivi 15 anos em França.

Qual é a mensagem que tenta passar através das suas canções com as baladas de amor que canta?
Por acaso fazem-me essa pergunta muitas vezes, se me considero antigo ou não. Eu considero-me um rapaz realista, eu acho que falar de amor ou de emoções não é preciso ter idade, ou seja, o amor e o romantismo não têm obstáculos.
Tenho a certeza que o amor não tem idade e acho ainda que o amor é um tema que diz respeito a qualquer pessoa. Todos já sofreram na vida pelo menos uma vez por amor.

O Mickael já sofreu por amor?
Já, algumas vezes, vamos lá a ver se não sofro mais. Agora eu acho que para se escrever é preciso ter-se já uma certa bagagem, e para mim escrever é muito importante porque escrevo sobre coisas que eu já vivi. Se não fosse assim não as escreveria.
Qualquer compositor ou autor tem a necessidade de escrever sobre aquilo que já viveu ou vive, para poder compor e dar um certo carácter às suas músicas.

Este seu recente trabalho difere muito do primeiro, ou é uma caixinha de surpresas?
Segue a mesma linha do primeiro. No entanto, eu tentei compor um álbum mais maduro, até porque também participei mais na sua produção, com a ajuda de uma distribuidora e de uma produtora. Contudo a linha deste álbum é exactamente a mesma do primeiro.

Qual é a maior importância que o Mickael dá nos espectáculos ao vivo; os cenários, a luz, a montagem, as bailarinas, os músicos?
O que me preocupa mais no concerto é fazer com que o público goste. Acho que o público tem de fazer parte desse concerto e isso é que é importante. Tento fazer isso em todos os concertos, e quanto aos sistemas de vídeos, luz, som, nada disso me preocupa… a minha atenção vai toda para o público que tento sempre agradar. Tenho um Staff à altura de me proporcionar os meios técnicos necessários…

Portanto acha que deve haver uma empatia entre o público e todo o espectáculo?
Exactamente.

Qual é a importância que o Mickael atribui às Rádios?
Eu acho que são muito importantes para dar a conhecer as músicas dos artistas. Confesso-lhe que é pena em Portugal, essa conversa já foi falada não sei quantas vezes, e eu vou ser mais um mas também não quero entrar em polémicas, mas se ouvirmos as rádios de outros países como a Espanha, e a França, que 70 % da música que passa nas rádios são de artistas nacionais. Em Portugal é ao contrário.

Então considera que existe uma grande descriminação das rádios em Portugal?
Eu acho que sim.

E na televisão?
Na televisão já não se sente tanta falta de apoio. Agora confesso-lhe que graças a Deus tudo tem corrido mesmo bem, e não sinto a falta desse apoio, Sei que é uma pena que para certos artistas não haja muito apoio.

Pensa que existem mais valores que devam ser divulgados na música ligeira portuguesa, como é o caso do Mickael?
Eu acho que sim. Portugal tem muitos talentos e acho que há espaço para todos e acho também que o que é importante é fazer as coisas bem feitas e com dignidade. Mas é claro que existe espaço para todos.

Jorge Fernando, Músico

Entrevista de Adelino Sá

Nos dias de hoje toda a gente fala do Fado. Será que o Fado merece toda esta atenção e porquê?
Eu acho que o Fado despertou esse interesse e merece que assim seja. É evidente que quando muita gente se volta para o Fado, é porque o Fado dá votos, neste momento. Chega ao Fado muita gente que fala sem terem o direito de falarem nele. Muita coisa se escreve sobre o Fado e sobre a sua origem. Eu penso que o Fado é um mistério, porque existem várias correntes sobe a natividade do Fado… prefiro a corrente do José Régio onde ele diz " que o Fado nasceu um dia, quando o vento mal bulia, o céu ao mar prolongava, na morada de um veleiro num peito de um marinheiro, que estando triste, cantava". Penso que é aí que o Fado nasce. Quando os marinheiros partem de Alfama, partem de Lisboa para conquistar o Mundo sem saber para onde iam, e sem saber se regressariam um dia. E as pessoas que ficavam no cais a despedirem-se deles, também não sabiam se os voltariam a ver. Como em tudo na vida, quando se dá expansão do Fado, esta exposição que por vezes chega a ser excessiva, há sempre gente que fala com razão e outra sem qualquer razão. Mas a minha opinião é que o Fado é genuinamente português.

Temos vindo a assistir nos últimos tempos â introdução de novos instrumentos ao Fado, como é caso dos violinos, percussão e piano… Na sua opinião, beneficia ou vem adulterar de alguma forma o castiço, a originalidade ao Fado?
Talvez não seja a pessoa ideal para falar sobe isso, porque fui eu que introduzi pela primeira vez outros instrumentos ao Fado. O que eu acho é que se pode mudar a forma sem mudar o conteúdo. A Amália canta o "Somertime" em inglês, que não é um Fado, mas quem a ouve sente que é uma fadista, porque o Fado é uma questão de alma, de conteúdo. A alma não se liga ou desliga consoante se quer. Podem-se fazer inovações porque o Fado não é mais do que uma música que tem que ser tirada da caixinha do sapato, não é. O que por vezes se faz é descaracterizar, mudando a forma e o conteúdo…ou seja a forma pode ser mudada, mas o conteúdo não. Tem que haver sempre fado naquilo que se faz. De resto qualquer instrumento pode ser usado no Fado, na minha opinião, desde que alma de quem o canta e de quem o toque seja fadista.

O Jorge Falou na Amália. O seu percurso começou com a Amália?
Começou com vinte anos. Penso que foi uma das minhas maiores sortes da minha vida porque hoje não seria a mesma pessoa, tanto no campo social como no musical, se não tivesse passado estes anos todos pela Amália, já que ela era uma fonte inesgotável de aprendizagem. Eu tive sempre o cuidado de aprender, fui sempre muito curioso, portanto muito do que sou hoje lhe devo.

Muitos dizem que o Fado não seria aquilo que é hoje, senão fosse a Amália. Concorda com esta expressão?
Perfeitamente. Ela mudou tudo. Desde o uso do xaile, aos vestidos, passando depois pelo próprio canto. Repare que passados tantos anos, depois do aparecimento da Amália, se continua a não esgotar o repertório da Amália e os fadistas que chegam, salvo raras excepções, são todos trazidos pela sua mão… o Fado e mesmo a própria cultura portuguesa, porque a cultura portuguesa se expandiu através da própria Amália, lhe devem muito. O Fado não seria o mesmo sem a Amália.

Fado é saudade?
Também é. Fado quer dizer destino e destino relaciona-se com a vida. O que o Fado tem e o que me fascina no Fado é o relato do dia a dia das pessoas. Agora porque se atribui mais saudade e lamento ao Fado? Porque na história da humanidade é muito mais marcante o que dói do que faz sorrir. É muito mais marcante a saudade do que aquilo que a gente já nem se lembra Diz-se que é através da dor que as pessoas crescem. E a saudade é uma dor, não é a rir que a gente cresce. Sofrendo os padecimentos ultrapassando-os. Qualquer Fado que fale de saudade e de tristeza é mais marcante do que uma marcha.

Qual é a importância que atribui aos poetas para as letras para o Fado?
Eu acho que não é só no Fado. Toda a música serve para levar as palavras. A música sem conteúdo, sem mensagem não tem a mesma força…repare, o Bach o Beethoven, Mozart, fizeram grandes músicas mas elas não se cantam na rua, porque na sua maioria faltam-lhe as palavras… e muitas delas bastantes fáceis de se cantarem, como a nona de Bethoven…penso mesmo que a música serve para levar as palavras. O segredo das palavras é nós identificarmo-nos com as mesmas através da música. Se a música for boa, através dos relatos das palavras, então aí o casamento é perfeito...

Eu que conheço muitas das suas letras, na minha opinião, o Jorge é um grande poeta. Para quando a publicação de um livro?
Obrigado. Estou farto de ser tentado e acho que ainda é cedo. Penso que tenho que escrever muito mais para escrever um livro. O papel aceita tudo aquilo que a gente quiser lá pôr…dá-se, por vezes, pouco valor ao livro em si. O Livro, como um disco, é uma obra sagrada que nos persegue a vida toda. E nos dias de hoje fazem-se livros por tudo e por nada, o fulano que traiu fulana e vice-versa… penso que se um dia escrever um livro com os meus poemas, têm que ser os melhores, e eu ainda estou na idade de amadurecimento e acho que ainda vou escrever coisas que talvez venham a traduzir melhor o que sou num livro. Vou esperar que a idade me retoque melhor ainda.

A sua fonte de inspiração, são as letras ou a música ou são os dois?
São os dois. Às vezes aparece a letra primeiro, outras vezes é a música que aparece antes… e, normalmente, as duas coisas ao mesmo tempo…

A inspiração aparece, ou é apenas um acaso?
Eu não acredito no acaso. Acho que nada é por acaso, tudo tem um significado na vida. Há uma palavra grega, que significa corrente de pensamento, onde tudo está plasmado e nada aparece por acaso. Eu não escrevo letras e músicas diariamente, tenho um intervalo próprio que sinto quando devo escrever e quando assim é, isolo-me completamente do mundo, parafraseando Fernando Pessoa, é aquela ansiedade crescente que me obriga a escrever. É a isto aquilo a que eu chamo inspiração. Muitos dizem que aquilo que faço é só por vaidade, mas qual vaidade se aquilo que faço não sei se é feito apenas por mim, como diz Pedro Homem de Mello. Não sei se aquilo que faço apenas por mim, sei apenas que sinto aquela necessidade de escrever, é como uma energia me passasse e eu seja apenas um veículo de qualquer que me é superior. Portanto é isso que reconheço como a minha inspiração.

O Jorge é cantor, compositor e músico. No entanto muitas das suas letras e músicas dá a outros intérpretes. Em qual pele se sente melhor; na de ser cantor compositor, ou de dar as suas letras e músicas a outros intérpretes?
Às vezes também penso nisso. E se me pedissem para abdicar de uma delas, não saberia o que responder. Era como me amputassem de algo muito importante, porque qualquer dessas facetas me deixa muito feliz e me enche a alma…penso que não seria uma pessoa por inteiro se tivesse que abdicar de uma dessas partes. Se a vida me põe no meu caminho pessoas com talento eu tenho então a obrigação de ajudar dessa maneira. É uma parte da minha vida que eu dou aos outros…ou seja, é a vida a dar à própria vida. Por isso eu adoro dar poemas e músicas minhas às outras pessoas, como adoro cantá-las também.
Já vi o Jorge a acompanhar como músico outros fadistas. Lembro a Maria da Fé, Ana Moura, entre outros…
Também é fundamental para mim. É servir a música, e servir quem canta é algo que adoro fazer, por isso toco diariamente numa Casa de Fados. Não concebo a minha vida sem tocar e partilhar esta energia com os outros.

O Fado tem futuro?
O fado tem presente. E quando se tem pressente, tem-se sempre futuro...

Maria do Céu Guerra, Actriz

Entrevista de Adelino Sá

No seu nome existe o “Céu” e a “Guerra”, isso é a busca do equilíbrio entre o céu a alcançar e a guerra a travar?
Ter este nome é puramente acidental, Guerra eram os meus avós e a minha mãe, Maria do Céu foi o meu pai que escolheu. A combinação destes dois nomes acabou por criar um conteúdo, um significado. Para alguns pode parecer um conceito, eu acho que quando muito, é um destino.

Como foi conciliar vida familiar e profissional?
Não foi fácil, mas é das profissões mais compensadoras, não a nível material mas a nível pessoal e espiritual. Em Portugal, foi sempre e ainda é complicado, ter filhos, criá-los e ser actriz.

Qual é para si o melhor e o pior de Portugal?
O melhor de Portugal é e tem sido sempre a sua situação geográfica, o sol, o mar, as pessoas que se deparam com situações de necessidade e sem grandes responsabilidades pelos desmandos que sempre acontecem naquele país.
O pior em muitos sectores é a falta de sentido de responsabilidade e a falta de sentido de serviço, na cultura, na política. São poucos aqueles que se sentem responsáveis por fazer e fazer bem e dar prova de si. Quando se chega a um determinado grau social as pessoas acham que já chegaram, que todas as pessoas têm obrigação de os respeitar, de lhes baixar a cabeça e perdem o sentido de serviço. Todos nós temos que trabalhar e prestar contas a todos, temos obrigações e sentido de responsabilidade, direitos e deveres.

Mas houve uma grande evolução com a entrada na Europa...
Portugal melhorou muito com a entrada na Europa teve várias injecções de dinheiro e ganhou condições de desenvolvimento que até aí não tinha. No entanto cada partido responsável que vai para o poder com muita dificuldade assume a responsabilidade desse poder.
Numa companhia de Teatro quando decidimos montar uma peça damos o sangue, a alma, damos tudo. Trabalhamos o que for preciso para que aquele trabalho corra bem. Para quando se abrem as portas ao público, que é quem nos vai julgar, ele continue a gostar do que fazemos, a respeitar-nos, a apoiar-nos e melhore a sua condição como espectador.
Muitas vezes os nossos políticos não têm esse sentido. Acho que cada pessoa nas suas funções tem que ter responsabilidade. Os nossos políticos, a maior parte das vezes, não têm sentido de serviço.
Chegam às estruturas de mais de alta responsabilidade de uma forma vaidosa, não dialogante, e sem pensar que é sua estrita obrigação prestar contas aos outros.

Na peça “O Pranto de Maria Parda” de Gil Vicente sente-se toda a força do povo português através da sua representação.
O povo de Portugal é extraordinário de norte a sul. Nas coisas que me é dado representar em cena, na sua vontade de viver, na sua vontade de ser feliz, no seu “élan” vital, são características maravilhosas do nosso povo quase intactas. Admiro-o pois ele é forte, criativo, solidário, verdadeiro.

António Manuel Ribeiro, vocalista do UHF

Entrevista de Adelino Sá

Como se encontram os UHF, depois de uma longa caminhada até aos dias de hoje?
Encontramo-nos num momento de grande felicidade. Ultrapassámos trinta anos de carreira. Lançámos um DVD e um duplo CD este ano, que se chama "Absolutamente ao vivo", gravado no Coliseu de Lisboa, e estamos em digressão e em simultâneo estamos a gravar nos espaços livres. Estamos a gravar um trabalho de originais que ainda poderá sair este ano ou no início do próximo ano. E é bom este momento que estamos a viver e é disto que um músico precisa, que é concertos, discos e canções novas…

Como é que o António Manuel Ribeiro vive o momento actual da música portuguesa?
Acho que já viveu melhores dias e penso que a música portuguesa está um pouco estagnada… talvez porque houve um encolhimento natural dentro do país, como houve no resto do mundo. Nós somos pequeninos e houve um encolhimento da indústria, naturalmente se há menos dinheiro para investir, menos projectos podem aparecer. Há uma renovação da música portuguesa que se faz um pouco por esticão. Não há um rio a correr como havia há uns tempos atrás, que todos os anos mostrava cada vez coisas novas, mas por outro lado há outra coisa nova que é a divulgação através da Net… há muitos trabalhos que as pessoas começam por fazer em casa e no outro dia estão a ser divulgados… eu digo muitas vezes com alguma ironia e com alguma experiência, que a música portuguesa entrou mais cedo em crise na era digital do que a crise mundial sócio e financeira que vivemos… e por isso também vamos sair mais depressa da crise, porque estamos há mais tempo a pensar em soluções… e acho que só se pode sair de uma crise com soluções novas.

Depois de trinta anos de carreira e fazendo um pouco uma retrospectiva, que é que te faltou fazer?
Menos disparates (risos). Bem, acho que alguns que fiz fizeram parte do meu crescimento e da minha ingenuidade, portanto vivi intensamente. Não está tudo feito… o artista compositor vive todos os dias para uma coisa que se chama aperfeiçoamento… nós vivemos para isso que é o aperfeiçoamento e isso é algo que está sempre inacabado…

Vamos falar de algo que poucos conhecem e que foi quando os UHF lançaram o António Variações… que pela sua enorme excentricidade foi algo de inovador no seu tempo… queres falar um pouco sobre o que aconteceu?
Olha, penso que foi em 1982, o Variações tinha lançado um Maxi-Single onde tinha aquela fantástica versão"Povo que lavas no Rio", e a Valentim Carvalho, que era nossa editora na altura, pediu-me se o podíamos apresentar numa primeira parte dos UHF num concerto que se fazia às noites de quinta-feira na antiga Feira Popular de Lisboa, que já desapareceu, e que eram transmitidos em directo pela Rádio Renascença, no programa de dois amigos meus, que se chamava "Meia de Rock" e tinha lá o Luís Vita e o Rui Pego, actual director da Antena 1. Naqueles espectáculos todas as pessoas podiam assistir e o António tinha uma peculiaridade muito grande, na forma de se vestir e de se produzir. Para esse espectáculo apareceu vestido de toureiro… sozinho no palco, era em play-back e ele só dava a voz. Então uns caramelos, que não gostaram ou acharam que era hora de provocar o cantor, decidiram começar a lançar umas pedrinhas, espécie de gravilha, lembro-me perfeitamente disto, para o palco. Ora, nós estávamos a apresentar um colega novo, ele estava ali sozinho no palco, aquilo deu-me uma raiva tão grande que entrei em palco, peguei no microfone e insultei as pessoas. Até provoquei, que quando terminei pensei que iria levar uma tareia de seguida… mas não, bateram palmas e o Variações pôde fazer o seu espectáculo e no final tudo correu bem… foi assim que tudo aconteceu…

Não é estranho muitos dos seus colegas pegarem nas suas canções e reeditarem discos e discos, e agora fala-se do António Variações como um ícone daquele tempo?
Não é normal enquanto ser humano, há coisas que não me agradam muito da vida. Vê o que aconteceu com o Michael Jackson, depois da morte dele estoiraram todos os Tops com as suas canções. O que eu acho é que depois de morto nós podemos chamar muitas coisas às pessoas e podemos usá-los em várias situações. E é pena, porque o Variações que eu conheci em vida, era uma pessoa muito solitária, não tinha muitos amigos, eu privei várias vezes com ele, há dias falava disso mesmo com uma antiga namorada minha dessa altura quando nós íamos ao "Frágil", e ele estava lá ao canto, sozinho, e poucas pessoas falavam com ele. Eu falei muito com ele sobre diversos temas e hoje vejo coisas ditas, publicadas, que me fazem um pouco de impressão, mas é a indústria da comunicação social que se serve dos mortos para ganhar dinheiro…

Sabemos que os UHF estão em estúdio a gravar um novo trabalho. Podes adiantar-nos algo sobre o mesmo?
Os UHF têm uma pele, como tal segue a mesma linha de todos os outros, melhora-se porque há avanço tecnológico e servimo-nos dele… nós temos uma identidade própria e o que estamos a gravar são coisas muito bonitas… é uma resposta aos casos da nação…

Existe algo que vos leve a provocar?
Não sei se é de provocar ou se é de unir. Eu só gosto de provocar os muito poderosos, que vai desde o governo às elites que estão estáveis no país. Mas há um grande sofrimento em Portugal. Eu não gosto que as pessoas se vão abaixo, eu não gosto que as pessoas se queixem, eu detesto o queixume… eu acho que é de nós, até porque somos uma nação com uma grande história, e isto não é demagogia, nós temos exemplos ao longo da nossa História que demonstraram que somos capazes. E somos capazes quando queremos inovar, quando queremos ir mais longe… eu tenho uma canção que se chama “Portugal somos nós"… porque é isso… Portugal não são as estradas, não são os estádios de futebol, Portugal não são as empresas estrangeiras que sugam o melhor de nós e depois fecham as portas, Portugal são os portugueses.

As telenovelas também é a vitrina da música portuguesa?
É… se me perguntasses há quatro anos, eu teria dúvidas, mas nos dias de hoje efectivamente é a vitrina da música portuguesa. As telenovelas da TVI e da SIC, produção nacional, neste momento fazem uma divulgação mais eficaz do que as próprias Rádios.

José Cesário, Deputado e ex-Secretário de Estado

Entrevista de Adelino Sá

Qual é a sua opinião em relação à situação actual do nosso país?
Portugal está a passar uma situação extremamente difícil no ponto de vista financeiro e económico. As nossas debilidades aumentam os nossos problemas. Num contexto destes, a relação com os seus que estão fora, com a sua diáspora, assume uma preponderância única. Em vários momentos da nossa História nós conseguimos sobreviver à custa do que tínhamos no exterior. Desde a era dos Descobrimentos, as especiarias da Índia, ou o ouro do Brasil, ou porque tínhamos Colónias, ou porque tínhamos as remessas de vários tipos de vários pontos do mundo, em que fundamentalmente estavam envolvidos portugueses, Portugal conseguiu sobreviver porque tinha estas posições no plano internacional. Neste momento a nossa diáspora volta a ter um papel fundamental. Não é só por causa das remessas. Com as nossas comunidades há muita influência de natureza política, económica e cultural que pode ser extremamente vital para uma presença diferente de Portugal no mundo. E com a economia globalizada ganha e progride quem for capaz de perceber e estar presente um pouco em todo o lado.

Como vê o problema dos novos fluxos emigratórios?
É óbvio que se nós temos problemas económicos, se temos muitas empresas que passaram por fases de reestruturação, e algumas até desapareceram, que assim atiraram para o desemprego milhares de pessoas e ao mesmo tempo não conseguimos dar empregos, muitos até licenciados, é obvio que as pessoas tiveram que sair. E continuam a sair de Portugal. E devemos dizer que muitos não saem porque o destino do país preferencial também está a passar situações delicadas como é o caso de Inglaterra, Espanha, França e outros países. Esta nova vaga de emigração tem problemáticas que em parte são iguais, ou parecidas, com as anteriores vagas de emigração, anos 70, 80 e 90, mas tem aspectos diferentes. Um dos aspectos é que esta nova vaga de emigração tem pessoas muito jovens e muitos deles com formação académica. Depois, há muita gente a sair de Portugal com 40 e 50 anos de idade, que trabalharam vinte e mais anos numa empresa, a empresa fechou e de repente ficam numa situação precária. Como não têm possibilidade de reconversão profissional, vêem-se obrigados a procurar outro lugar para ganharem o seu pão. Essas pessoas também têm especificidades muito próprias. E também há pessoas que emigram e já levam consigo a família, coisa que não acontecia nos 60 e 70… isso só acontecia ao fim de alguns anos. Ao levarem os filhos, temos aí também problemas específicos, nomeadamente com o Ensino. A própria questão da mulher… a mulher emigra mais hoje do que há uns anos. A abordagem da emigração tem de ser vista de diferente modo nos dias de hoje. Sejamos claros, muitas das respostas ao problema da emigração não podem ser só dadas pelo Estado. As resposta têm que ser dadas em conjunto com as comunidades, o Estado e os países de acolhimento.

O senhor foi Secretário de Estado. Neste momento é deputado pelo círculo da emigração. Como vê a actuação actual Secretário de Estado?
Sejamos francos. Não é fácil governar. E não é fácil governar hoje como não foi no passado. Tenho a perfeita consciência disso. Governar implica tomar opções. O ter de administrar algo, que não sendo nosso, é do colectivo, temos que administrar como se fosse nosso. O que não é fácil. Tenho a consciência de quando estive no governo tive que tomar opções que nalguns casos foram compreendidas, e que noutros não. Algumas sofreram alguma contestação. Como tenho outras que recebo ainda nos dias de hoje aplausos… como a recuperação da nacionalidade por parte dos portugueses que a tinha perdido, por terem outra, antes de 1981, especialmente pelo círculo fora da Europa, merece aplausos. Mas o facto de temos encerrado 6 postos consulares, motivou efectivamente muitos protestos. Disseram tão mal de mim por ter encerrado 6 postos consulares, não sei o que dizem hoje por o actual executivo ter encerrados 25 postos consulares. Disseram tão mal por questões do ensino, e nos dias de hoje temos uma Escola virtual que não existe, como não existe os consulados virtuais, que foi anunciado com tanta pompa e circunstância, … mas o pior é a tal relação afectiva que não existe. Portugal tem mais do que nunca estar próximo dos portugueses. Temos portugueses que uma grande influência no mundo, através das suas empresas, ou através do ponto de vista político, essas pessoas têm influências que são extremamente importantes para nós. O primeiro objectivo que qualquer governo deve ter, é aproximar-se desta diáspora, e acho que o actual governo não o conseguiu fazer. Pelo contrário, penso que perdeu espaço, encontro alguma contestação, mas o pior que encontro é indiferença… o que é muito pior. É sinal de que as pessoas baixaram os braços e se desinteressaram do governo.

Os Conselheiros das comunidades existem, ou não existem?
O Conselho das Comunidades existe e não existe. A Lei do Conselho das comunidades foi alterada, contra o nosso voto, não estávamos de acordo, e o Conselho das comunidades fundamentalmente existe ao nível das chamadas comissões temáticas, que reúnem em Portugal duas vezes por ano e quase se esgota nisto. O primeiro dever dos Conselheiros das Comunidades é a representação local, para representarem aqueles que os elegem. Hoje os Conselheiros das Comunidades vão duas vezes a Portugal falar abstractamente de um conjunto de coisas, que às vezes são muito interessantes, não digo que não, mas que perdem muito na tal representação local. Os meios que são limitados, são quase todos gastos nestas duas reuniões que se realizam em Lisboa. Apareceram também agora os órgãos consultivos, que devo dizer que até podem ter um papel interessante, já o defendi no passado, mas tem que ter uma ligação ao Conselho das Comunidades. Se não tiver uma ligação ao conselho das Comunidades podemos começar a ter uma competição, o que não é desejável.

Foi apresentado o PEC, que influência pode ter na relação com a diáspora?
Bom, já foi apresentado o segundo PEC. Mas o mais importante que se deve dizer, é que senão se tomarem estas medidas, vai ser muito pior. Um país não subsistir quando paga dívida com recurso a nova dívida. Tudo o que se está a passar foi dito pelo PSD nos últimos anos. O que a Dra. Manuela Ferreira e o Dr Marques Mendes disseram, foi exactamente isto que se está a passar. Os erros não foram cometidos por nós, e não me venham dizer que os políticos são todos iguais. Temos que ter desenvolvimento, mas não o podemos ter a qualquer custo. É duro de dizer, mas se gastamos 500 milhões no rendimento de reinserção, se calhar só podemos gastar 100 milhões. É preciso escolher muito bem a quem se deve apoiar. O ano de maior embate no pagamento da divida vai ser em 2012. A diáspora tem de perceber, e percebe muito bem, estou convencido disso, que não vai ser possível ter determinado tipo de medidas, até sociais, ou seja, em prol da estabilidade… é preciso implementar medidas, até na oposição, é preciso manter uma postura diferente, de construção, na defesa do nosso país…

Ronalda, Cantora

Entrevista de Adelino Sá

Como vê esta euforia à volta do seu irmão Ronaldo?
É um motivo de muito orgulho e é claro que estamos todos muito satisfeitos.

Dedica muito tempo às comunidades portuguesas, sabemos que viaja muito?
Felizmente tenho recebido muitos convites de toda a parte do mundo para eu actuar, e é um enorme prazer poder fazê-lo. As comunidades recebem-nos muito bem e depois é uma enorme oportunidade de podermos apresentar o nosso trabalho…

Defina-nos o seu tipo de música, o que transmite?
É uma música romântica, muito latina… e fala-nos de amor, de encontros e desencontros…

Esses encontros e desencontros têm a ver consigo?
Não propriamente, as minhas mensagens estão direccionadas ao público em geral… são mensagens de um pouco do que acontece a todos… não necessariamente a mim. Eu penso naqueles em que vamos oferecer o nosso trabalho, é isso que faço.

Para o futuro…
O futuro é trabalhar sempre e lançar novos trabalhos, que é exactamente o que estou a fazer. Trabalhar e dar o meu melhor ao público que gosta do que eu faço. Este meu trabalho chama-se “Corpo e alma” e é um trabalho onde dou o meu melhor, dado que sinto na perfeição.

Quem escreve os seus temas?
O meu produtor, que é o Jorge Carlos, uma compositora que é a Niquita, e alguns sou eu que os escrevo…

É uma novidade que os nossos leitores vão gostar… que temas são esses?
É uma música de apoio à nossa selecção e outra dedicada ao meu irmão… mas já tinha escrito noutros trabalhos, uma dedicada ao meu pai e outra ao meu filho.

Também é de opinião que as rádios bloqueiam a música portuguesa?
Sim, é verdade que a música popular portuguesa está a cair um pouco no esquecimento, talvez porque o mercado é muito concorrido e não há como agradar a toda a gente… eu tento não me preocupar com essa situação, esse é um problema de quem está no meio... há música para todos os gostos e deve-se dizer que há quem faça boa música… só tem que se escolher…