quinta-feira, 9 de setembro de 2010

José Cesário, Deputado e ex-Secretário de Estado

Entrevista de Adelino Sá

Qual é a sua opinião em relação à situação actual do nosso país?
Portugal está a passar uma situação extremamente difícil no ponto de vista financeiro e económico. As nossas debilidades aumentam os nossos problemas. Num contexto destes, a relação com os seus que estão fora, com a sua diáspora, assume uma preponderância única. Em vários momentos da nossa História nós conseguimos sobreviver à custa do que tínhamos no exterior. Desde a era dos Descobrimentos, as especiarias da Índia, ou o ouro do Brasil, ou porque tínhamos Colónias, ou porque tínhamos as remessas de vários tipos de vários pontos do mundo, em que fundamentalmente estavam envolvidos portugueses, Portugal conseguiu sobreviver porque tinha estas posições no plano internacional. Neste momento a nossa diáspora volta a ter um papel fundamental. Não é só por causa das remessas. Com as nossas comunidades há muita influência de natureza política, económica e cultural que pode ser extremamente vital para uma presença diferente de Portugal no mundo. E com a economia globalizada ganha e progride quem for capaz de perceber e estar presente um pouco em todo o lado.

Como vê o problema dos novos fluxos emigratórios?
É óbvio que se nós temos problemas económicos, se temos muitas empresas que passaram por fases de reestruturação, e algumas até desapareceram, que assim atiraram para o desemprego milhares de pessoas e ao mesmo tempo não conseguimos dar empregos, muitos até licenciados, é obvio que as pessoas tiveram que sair. E continuam a sair de Portugal. E devemos dizer que muitos não saem porque o destino do país preferencial também está a passar situações delicadas como é o caso de Inglaterra, Espanha, França e outros países. Esta nova vaga de emigração tem problemáticas que em parte são iguais, ou parecidas, com as anteriores vagas de emigração, anos 70, 80 e 90, mas tem aspectos diferentes. Um dos aspectos é que esta nova vaga de emigração tem pessoas muito jovens e muitos deles com formação académica. Depois, há muita gente a sair de Portugal com 40 e 50 anos de idade, que trabalharam vinte e mais anos numa empresa, a empresa fechou e de repente ficam numa situação precária. Como não têm possibilidade de reconversão profissional, vêem-se obrigados a procurar outro lugar para ganharem o seu pão. Essas pessoas também têm especificidades muito próprias. E também há pessoas que emigram e já levam consigo a família, coisa que não acontecia nos 60 e 70… isso só acontecia ao fim de alguns anos. Ao levarem os filhos, temos aí também problemas específicos, nomeadamente com o Ensino. A própria questão da mulher… a mulher emigra mais hoje do que há uns anos. A abordagem da emigração tem de ser vista de diferente modo nos dias de hoje. Sejamos claros, muitas das respostas ao problema da emigração não podem ser só dadas pelo Estado. As resposta têm que ser dadas em conjunto com as comunidades, o Estado e os países de acolhimento.

O senhor foi Secretário de Estado. Neste momento é deputado pelo círculo da emigração. Como vê a actuação actual Secretário de Estado?
Sejamos francos. Não é fácil governar. E não é fácil governar hoje como não foi no passado. Tenho a perfeita consciência disso. Governar implica tomar opções. O ter de administrar algo, que não sendo nosso, é do colectivo, temos que administrar como se fosse nosso. O que não é fácil. Tenho a consciência de quando estive no governo tive que tomar opções que nalguns casos foram compreendidas, e que noutros não. Algumas sofreram alguma contestação. Como tenho outras que recebo ainda nos dias de hoje aplausos… como a recuperação da nacionalidade por parte dos portugueses que a tinha perdido, por terem outra, antes de 1981, especialmente pelo círculo fora da Europa, merece aplausos. Mas o facto de temos encerrado 6 postos consulares, motivou efectivamente muitos protestos. Disseram tão mal de mim por ter encerrado 6 postos consulares, não sei o que dizem hoje por o actual executivo ter encerrados 25 postos consulares. Disseram tão mal por questões do ensino, e nos dias de hoje temos uma Escola virtual que não existe, como não existe os consulados virtuais, que foi anunciado com tanta pompa e circunstância, … mas o pior é a tal relação afectiva que não existe. Portugal tem mais do que nunca estar próximo dos portugueses. Temos portugueses que uma grande influência no mundo, através das suas empresas, ou através do ponto de vista político, essas pessoas têm influências que são extremamente importantes para nós. O primeiro objectivo que qualquer governo deve ter, é aproximar-se desta diáspora, e acho que o actual governo não o conseguiu fazer. Pelo contrário, penso que perdeu espaço, encontro alguma contestação, mas o pior que encontro é indiferença… o que é muito pior. É sinal de que as pessoas baixaram os braços e se desinteressaram do governo.

Os Conselheiros das comunidades existem, ou não existem?
O Conselho das Comunidades existe e não existe. A Lei do Conselho das comunidades foi alterada, contra o nosso voto, não estávamos de acordo, e o Conselho das comunidades fundamentalmente existe ao nível das chamadas comissões temáticas, que reúnem em Portugal duas vezes por ano e quase se esgota nisto. O primeiro dever dos Conselheiros das Comunidades é a representação local, para representarem aqueles que os elegem. Hoje os Conselheiros das Comunidades vão duas vezes a Portugal falar abstractamente de um conjunto de coisas, que às vezes são muito interessantes, não digo que não, mas que perdem muito na tal representação local. Os meios que são limitados, são quase todos gastos nestas duas reuniões que se realizam em Lisboa. Apareceram também agora os órgãos consultivos, que devo dizer que até podem ter um papel interessante, já o defendi no passado, mas tem que ter uma ligação ao Conselho das Comunidades. Se não tiver uma ligação ao conselho das Comunidades podemos começar a ter uma competição, o que não é desejável.

Foi apresentado o PEC, que influência pode ter na relação com a diáspora?
Bom, já foi apresentado o segundo PEC. Mas o mais importante que se deve dizer, é que senão se tomarem estas medidas, vai ser muito pior. Um país não subsistir quando paga dívida com recurso a nova dívida. Tudo o que se está a passar foi dito pelo PSD nos últimos anos. O que a Dra. Manuela Ferreira e o Dr Marques Mendes disseram, foi exactamente isto que se está a passar. Os erros não foram cometidos por nós, e não me venham dizer que os políticos são todos iguais. Temos que ter desenvolvimento, mas não o podemos ter a qualquer custo. É duro de dizer, mas se gastamos 500 milhões no rendimento de reinserção, se calhar só podemos gastar 100 milhões. É preciso escolher muito bem a quem se deve apoiar. O ano de maior embate no pagamento da divida vai ser em 2012. A diáspora tem de perceber, e percebe muito bem, estou convencido disso, que não vai ser possível ter determinado tipo de medidas, até sociais, ou seja, em prol da estabilidade… é preciso implementar medidas, até na oposição, é preciso manter uma postura diferente, de construção, na defesa do nosso país…

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